domingo, 29 de junho de 2008

Sienta la Cabeza




     Era um passeio despretensioso de domingo quando demos de cara com seres absolutamente vivos e pulsantes e coloridos e dançantes fazendo esculturas nos cabelos dos passantes. Trabalhavam concentrados alheios à velocidade dos dias atuais, embalados por um dj, criando as mais variadas formas e cores nas cabeças daqueles que se dispunham a experimentar um novo jeito de pentear, de olhar e de pensar. Delicioso de participar mesmo de longe, com um rabo de cavalo.
     Depois vim a saber que tratava-se de uma companhia espanhola chamada Sienta La Cabeza, fundada por uma brasileira que na verdade era cabeleireira. Prova  que vida e arte não se distinguem. Junto de uma espanhola e de um inglês, rodam o mundo fazendo a cabeça das pessoas. 
     Pena que não há por enquanto previsão de mais apresentações no Brasil. Mas deixaram inspiração de sobra por aqui...

www.sientalacabeza.com

terça-feira, 24 de junho de 2008

Ana Cañas e duas histórias



    A primeira história começa assim:
    Há 6 ou 7 anos atrás eu trabalhava como monitora de exposição de um grande Centro Cultural de São Paulo. Entre todos os meus colegas de labuta, havia uma garota de nariz arrebitado e altivez no olhar. Eu a observava com especial interesse porque seus gestos faziam desenhos no ar enquanto articulava, e embora muitas vezes argumentasse como uma menina, todos a levavam à sério.
    Nunca ficamos amigas, e eu arriscaria até dizer que não era de seu feitio travar amizades pelo convívio vulgar de um ambiente de trabalho. 
    De um modo geral tratava a todos com doçura e uma certa hostilidade. Aliás havia em sua eficiência uma displicência, como se fosse uma princesa coroada de um reino muy distante. 
    Evidente que tentava disfarçar, mas para pessoas com um olhar aguçado como o meu, estava claro que ela, de alguma forma, suspeitava de seu futuro auspicioso. 
    E foi assim que ela se foi. Sem ninguém saber o porquê. Como se tivesse coisa mais importante pra fazer. Simplesmente não apareceu mais.
    A segunda história não sei bem como começa, se foi no You Tube, na Lastfm ou  na rádio Eldorado. O fato é que comecei a ouvir uma  cantora dessa tal nova safra.
     Sua voz carregada de subjetividade me atingiu em cheio. É de uma grandeza arrebatadora, de uma força de diva de jazz. É de um jeito de menina que parece estar brincando e assusta-se porque os outros a levam à sério.
     Tem a alma colorida. Usa saia rodada e brincos grandes. Tem grandes olhos abertos  de insônia de quem vê a cidade do alto. E acha graça dos que dormem em absoluto silêncio. Tem um moço com quem divide taças de vinho e sonhos de vida com tanta arte que às vezes sangra pelas paredes. 
    E ela canta, a música a inventou. E ela inventou de cantar. Ainda bem. Pois assim tem  preenchido minhas tardes de poesia. E pude saber que minha misteriosa colega de trabalho tinha que se transformar em  Ana Cañas.
 


sexta-feira, 6 de junho de 2008

Todos os Homens do Mundo





      Não foi paixão à primeira vista. Na verdade, da primeira vez achei mal editado, sem ritmo e um pouco confuso. 
      Mas com o passar dos programas fui sendo cativada pela doçura de Domingos de Oliveira, pelo seu olhar que olha e que vê, e de quem ouve além das palavras.
     A parceria pulsante com Priscilla Rozembaun me enche de esperanças de que realmente não existe diferença entre a vida e a arte, e principalmente entre o amor e a vida! 
    As entrevistas são generosas porque são verdadeiros encontros de pessoas interessadas umas nas outras. Beira ali um clima de mesa de bar, de camaradagem absoluta.
    Delícia ser assim surpreendida com um programa de televisão. Aliás para descrença geral da nação, a televisão anda me causando boas surpresas ultimamente. Acho que foi um jeito diferente de aproveitar o olhar do que vejo.
   Para encerrar, o texto declamado por Domingos de Oliveira em seu filme  "Separações" e que lhe caí como uma luva.


 Homem Lúcido
     O homem lúcido sabe que a vida é uma carga tamanha de acontecimentos e emoções que nunca se entusiasma com ela, assim como não teme a morte. 
    O homem lúcido sabe que viver e morrer são o mesmo em matéria de valor, posto que a Vida contém tantos sofrimentos que a sua cessação não pode ser considerada um mal.
    O homem lúcido sabe que é o equilibrista na corda bamba da existência. Sabe que, por opção ou acidente, é possível cair no abismo, a qualquer momento, interrompendo a sessão do circo.

    Pode também o homem lúcido optar pela Vida. Aí então, ele esgotará todas as suas possibilidades. Passeará por seu campo aberto e por suas vielas floridas. Saberá ver a beleza em tudo. Terá amantes, amigos, ideais. Urdirá planos e os realizará. Resistirá aos infortúnios e até às doenças. E, se atingido por algum desses emissários, saberá suportá-los com coragem e mansidão.
   Morrerá o homem lúcido de causas naturais e em idade avançada, cercado por filhos e netos que seguirão sua magnífica aventura. Pairará então, sobre sua memória uma aura de bondade. Dir-se-á: aquele amou muito e fez bem às pessoas.

    A justa lei máxima da natureza obriga que a quantidade de acontecimentos maus na vida de um homem iguale-se sempre à quantidade de acontecimentos favoráveis. O homem lúcido que optou pela Vida, com o consentimento dos Deuses, tem o poder magno de alterar esta lei. Na sua vida, os acontecimentos favoráveis estarão sempre em maioria.
    Esta é uma cortesia que a Natureza faz com os homens lúcidos.

texto Caldaico(*) do VI século a.C

Todos os Homens do Mundo
Canal Brasil
Quarta às 21h30  alternativo: Quinta às 16h30 e Sábado às 15h30